quarta-feira, 29 de abril de 2009

Não cabe mais

Foi publicada na edição de ontem (terça-feira, dia 28) do Diário Oficial do estado, a Portaria Nº 03/09, da lavra do Dr. Ricardo Jorge Cavalcante Lima, juiz de Direito substituto da 16ª Vara Criminal da Capital (Execuções Penais). O ato proibe a entrada de presos oriundos de delegacias e presídios no sistema penitenciário, tendo em vista que as penitenciárias do estado já ultrapassaram - e muito - a lotação permitida. Segue, abaixo, a íntegra da Portaria:

PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE MACEIÓ
JUÍZO DE DIREITO DA 16ª VARA CRIMINAL - EXECUÇÕES PENAIS DE MACEIÓ

PORTARIA Nº 03 DE 24 (VINTE E QUATRO) DE ABRIL DE 2009 (DOIS MIL E NOVE) – PROIBIÇÃO DA ENTRADA DE PRESOS NO SISTEMA PRISIONAL DE MACEIÓ/AL


O Doutor RICARDO JORGE CAVALCANTE LIMA, juiz de Direito Substituto da 16ª Vara Criminal de Maceió, no uso de suas atribuições legais e regimentais, resolve:

CONSIDERANDO que as Unidades Prisionais são deficientes em suas estruturas físicas, comprometendo a custódia dos apenados;

CONSIDERANDO que a população carcerária da Penitenciária Masculina Baldomero Cavalcante de Oliveira e a do Presídio Masculino Professor Cyridião Durval e Silva ultrapassa mais de 60% do limite máximo permitido, que a da Casa de Detenção de Maceió ultrapassa mais de 30% e a do Presídio Feminino Santa Luzia encontra-se no limite máximo
de sua capacidade;

CONSIDERANDO a solicitação do Diretor das Unidades Penitenciárias quanto à vetação da entrada de presos provisórios oriundos das Delegacias da Capital e do Interior, em virtude dessa superpopulação carcerária;

CONSIDERANDO a manifestação do representante do Ministério Público favorável à suspensão do recebimento de preso no sistema prisional de Maceió/AL;

DETERMINO A PROIBIÇÃO DA ENTRADA DE PRESOS NO SISTEMA PENITENCIÁRIO VINDO DE DELEGACIAS E PRESÍDIOS ATÉ POSTERIOR ORDEM
JUDICIAL DESTE JUÍZO.


Esta Portaria entra em vigor na data da sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.

RICARDO JORGE CAVALCANTE LIMA
Juiz de Direito Substituto da 16ª Vara Criminal

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Aidéticos e Tuberculosos se Misturam nas Cadeias

De autoria de Rodio Nogueira. Publicado no Jornal Extra, ano XI, Nº 51, edição de 24 de dezembro de 2008 a 09 de janeiro de 2009.

Ciridião Durval, Baldomero, São Leonardo e Santa Luzia lideram índice de infectados

A questão é antiga e o procedimento é o mesmo. Gestores do sistema prisional alagoano se comportam sempre da mesma maneira para esconder o que ocorre por trás dos muros das prisões do Estado. Detentos portadores de Aids e tuberculose se misturam diariamente e fazem refeição no mesmo refeitório. O drama atinge os presídios Baldomero Cavalcante, Ciridião Durval, São Leonardo, presídio Santa Luzia e o da cidade de Arapiraca. Os casos de óbitos por Aids ou tuberculose são omitidos.

Mas uma fonte do Instituto Médico Legal Estácio de Lima de Maceió e Arapiraca denunciou ao jornal Extra que a ordem neste caso é não revelar a verdadeira causa da morte do detento. E que normalmente o atestado de óbito expedido apresenta como motivo insuficiência cárdio-respiratória ou ataque cardíaco. E como a fonte que assina o laudo é oficial, a família normalmente não costuma questionar.

Existe a informação de que o número de presos portadores de Aids é grande e que não existe nenhum controle por parte do setor de saúde. Quando o caso chega ao extremo com o doente em fase terminal ele é levado para o Hospital de Doenças Tropicais (HDT), localizado no Trapiche da Barra, onde o assunto fica sob absoluto sigilo. E muitas vezes até a família não tem acesso a informação.

Neste caso, a vítima tem o caixão lacrado e é sepultado o mais rápido. Há quem diga que é para atender as determinações do Ministério da Saúde. Dentro das cadeiras é rigorosamente proibido fazer comentário sobre o caso. Apesar dos cerca de dois mil sentenciados espalhados pelas prisões, este assunto se vazado pode acarretar vários problemas para os apenados que vivem sobre a lei dos gestores. O caso é tão sério que mesmo os parentes dos mortos não ousam tocar no assunto.

Fome e Desprezo Ameaçam Detentos

A leptospirose ou popular "doença do rato" como é chamada pelos sentenciados tem sido uma grave ameaça a população carcerária alagoana. Pessoas denunciam que as celas estão infectas, os sanitários sempre sujos e o lixo se espalha pelos corredores das cadeias. Mas, é durante a noite que os presos ficam vulneráveis a contaminação, devido ao ataque de ratos que passeiam pelos corredores.

Um detento que ganhou a liberdade há pouco tempo revelou ao jornal Extra que a imundice é grande e que os gestores nada fazem para evitar a proliferação de doenças. Mas, sabem mandar punir quem não se enquadrar ao sistema que é perverso e venal. Um outro detento que não pode ter a identidade revelada disse que no período de chuva a água invade as celas e os sanitáriosjogam para o salão urina e fezes. "Observe os presos. São quase todos amarelos", comenta o ex-detento.

O ano de 2008 registrou dezenas de fugas, assassinatos e rebeliões. Os motivos, ainda segundo o ex-preso acusado de tentativa de homicídio, estão ligados às péssimas condições das prisões, alimentação que mais parece lavagem e o tratamento imposto por alguns diretores. "O mundo na prisão é de cão. Quem tem algum dinheiro pode comprar sua alimentação fora do sistema e chega até ter proteção de algum agente corrupto", revela o ex-preso.

Ele completa afirmando que graças a Deus o juiz Marcelo Tadeu, ex-titular da Vara Criminal, foi um grande protetor dos detentos. "Ele dentro da visão jurídica defendeu aquele que um dia cometeu algum tipo de delito. Foi atuante e soube trabalhar. Ele era querido pelos presos espalhados pelo Estado porque a Intendência Penitenciária não faz nada para melhorar a condição de vida. Marcelo Tadeu diante do caos que envolve os presídios denunciou que aidéticos e tuberculosos estão misturados nos presídios alagoanos.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Esta conversa será gravada: Pé no SAC(O)



No dia 13 de março do corrente ano, com a publicação no Diário Oficial, passou a vigorar a Portaria Nº 49, de 12 de março de 2009, da Secretaria de Direito Econômico. Por tal Portaria, considera-se abusiva a recusa das empresas em fornecer, quando solicitadas pelo consumidor ou órgão competente, a gravação de chamadas efetivadas para o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor), em 10 (dez) dias. O parágrafo único deste artigo determina, ainda, que a entrega deverá ocorrer por meio eletrônico (e-mail), correspondência ou pessoalmente, a critério do solicitante. Por meio desta Portaria, a famosa frase “esta conversa será gravada”, comumente utilizada pelos atendentes do SAC, e que impunha tanto receio ao consumidor e, ao mesmo tempo, evidenciava sua impotência, posto que o mesmo jamais teria acesso ao teor do atendimento (no máximo, lhe era passado um número de protocolo, que de nada servia), se voltou a seu favor. Tanto é assim que a recusa, por parte da empresa, gera presunção relativa de veracidade das reclamações do consumidor quanto à violação do Decreto 6523/2000, conforme preconiza o art. 2º da citada Portaria.

Como se trata de um Direito do Consumidor, o leitor que se deparar com uma situação de recusa do Serviço de Atendimento em fornecer a gravação, deve anotar a data e a hora em que ocorreu a ligação (e o tal número de protocolo, se for fornecido), e elaborar uma reclamação no PROCON. No próprio órgão, há pessoas que podem tomar a termo as declarações de pessoas que não saibam ou não possam fazer sua própria reclamação.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

"Lei Clodovil"


Foi sancionada, no dia 17 de abril, a lei Nº 11.924/2009, fruto do projeto Nº 206/2207, de autoria do Deputado Clodovil Hernandes, falecido em março deste ano. Através desta lei, que muitos já denominam "Lei Clodovil", o enteado poderá adotar o nome de família da madrasta ou do padrasto, o que consagra, em termos registrais, a chamada paternidade sócio-afetiva. Certamente, Clodovil se inspirou em sua própria vida para realizar tal proposição, visto que foi adotado pelo casal Domingos Hernandes e Izabel Sanches Hernandes. Segue a íntegra da lei Nº 11.924/09:


Presidência da República Casa Civil


Subchefia para Assuntos Jurídicos


LEI Nº 11.924, DE 17 DE ABRIL DE 2009.


Altera o art. 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome da família do padrasto ou da madrasta.


O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:


Art. 1o Esta Lei modifica a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei de Registros Públicos, para autorizar o enteado ou a enteada a adotar o nome de família do padrasto ou da madrasta, em todo o território nacional.


Art. 2o O art 57 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, passa a vigorar acrescido do seguinte § 8o:


“Art. 57. ..................................................................................................................................................................

§ 8o O enteado ou a enteada, havendo motivo ponderável e na forma dos §§ 2o e 7o deste artigo, poderá requerer ao juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família.” (NR)


Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.


Brasília, 17 de abril de 2009; 188o da Independência e 121o da República.


LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Tarso Genro


Este texto não substitui o publicado no DOU de 17.4.2009 - Edição extra
“Tirem este viado do ar!”
Frase atribuída por Clodovil a Ulysses Guimarães, de quem supostamente teria partido a ordem para que o estilista e apresentador de TV fosse demitido da Rede Manchete, em 1988, em razão de Clodovil ter se referido à Assembléia constituinte como “prostituinte”.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Tiradentes - Sentença Condenatória aos Membros da Inconfidência Mineira


Tiradentes Esquartejado, quadro de Pedro Américo, 1893


ACCORDÃO em Relação os da Alçada etc.

Vistos este autos que em observância das ordens da dita senhora se fizeram summários aos vinte e nove Réus pronunciados conteudos na relação folhas 14 verso, devassas, perguntas apensos de defesa allegada pelo Procurador que lhe foi nomeado etc, Mostra-se que na Capitania de Minas alguns Vassallos da dita Senhora, animados do espírito de perfídia ambição, formaram um infame plano para se subtrahirem da sujeição, e obediência devida a mesma senhora; pretendendo desmembrar, e separar do Estado aquella Capitania, para formarem uma república independente, por meio de urna formal rebelião da qual se erigiram em chefes e cabeças seduzindo a uns para ajudarem, e concorrerem para aquella perfida acção, e communicando a outros os seus atrozes, e abomináveis intentos, em que todos guardavam maliciosamente o mais inviolável silêncio; para que a conjuração pudesse produzir effeito, que todos mostravam desejar, pelo segredo e cautela, com que se reservaram de que chegasse à notícia do Governador, e Ministros porque este era o meio de levarem avante aquelle horrendo attentado, urgido pela infidelidade e perfídia: Pelo que não só os chefes cabeças da Conjuração, e os ajudadores da rebelião, se constituíram Réus do crime de Lesa Magestade da primeira cabeça, mas também os sabedores, e consentidores della pelo seu silêncio; sendo tal a maldade e prevaricação destes Réus, que sem remorsos faltaram à mais incomendável obrigação de Vassallos e de Catholicos, e sem horror contrahiram a infâmia de traidores, sempre inherente, e anexa a tão enorme, e detestável delicto.


Mostra-se que entre os chefes, e cabeças da Conjuração o primeiro que suscitou as idéias de república foi o Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes, Alferes que foi da Cavallaria paga da Capitania de Minas, o qual a muito tempo, que tinha concebido o abominável intento de conduzir os povos daquella Capitania a uma rebelião; pela qual se subtrahissem da justa obediência devida á dita senhora, formando para este fim publicamente discursos sediciosos que foram denunciados ao Governador de Minas atencessor do atual, e que então sem nenhuma razão foram despresados como consta a folhas 74 folhas 68 verso folhas 127 verso e folha 2 do appenso numero 8 da devassa principiada nesta cidade; e suposta que aquelles discursos não produzissem naquelle tempo outro efeito mais do que o escândalo a abominação que mereciam, contudo como o Réu viu que o deixaram formar impunemente aquellas criminosas práticas, julgo por occasião mais oportuna para continual-as com maior efficácia, no anno de mil setecentos, e oitenta e oito em que o actual Governador de Minas tomou posse do governo da Capitania, e travava de fazer lançar a derrama, para completar o pagamento de cem arrobas de ouro, que os povos de Minas se obrigaram a pagar annualmente, pelo oferecimento voluntário que fizeram em vinte e quatro de março de mil setecentos e trinta e quatro; aceito e confirmado pelo Alvará de três de dezembro de mil setecentos e cincoenta em lugar da Capitação desde então abolida.


Porem persuadindo-se o Réu, de que o lançamento da derrama para completar o computo das cem arrobas de ouro, não bastaria para conduzir os novos à rebellião, estando elles certos, em que tinham oferecido voluntariamente aquelle computo, como um subrogado muito favoravel em lugar do quinto de ouro que tirassem nas Minas, que são um direito real eTn todas as Monarchias; passou a publicar que na derrama competia a cada pessoa pagar as quantias que arbitrou, que seriam capazes de atemorizar os povos, e pretender fazer contemeratio atrevimento, e horrendas falcidades, odioso o suavíssimo e ilustradíssimo governo da dita senhora, e as sábias providências dos seus Ministros de Estado, publicando que o actual governador de Minas tinha trazido ordem para opprimir, e arruinar os leais Vassallos da mesma senhora, fazendo com que nenhum delles pudesse ter mais de dez mil cruzados, o que jura Vicente Vieira da Morta a folhas 60 e Basilio de Brito Malheiro a folhas 52 verso ter ouvido a este Réu, e a folha 108 da devassa tirada por ordem do Governador de Minas, e que o mesmo ouvira a João da Costa Rodrigues a folhas 57, e o Conego Luiz Vieira a folhas 60, verso da devassa tirada por ordem do Vice-Rei do Estado.

Mostra-se que tendo o dito Réu Tiradentes publicado aquellas horríveis e notórias falcidades, como alicerce da infame machine, que pretendia estabelecer, comunicou em setembro de mil setecentos e oitenta e oito as suas perversas idéias, ao Réu José Alves Maciel visitando-o nesta cidade a tempo que o dito Maciel chegava de viajar por alguns Reinos estrangeiros, para se recolher a Vila Rica donde era natural, como consta a folhas 10 do appenso n. 1 e folhas 2 verso, do appenso n. 12 da devassa principiada nesta Cidade, e tendo o dito Réu Tiradentes encontrado no mesmo Maciel, não só approvação mas também novos argumentos que o confirmaram nos seus execrandos projectos como se prova a folhas 10 do dito appenso n. 1 e a folhas 7 do appenso n. 4 da dita devassa; saíram os referidos dois Réus desta Cidade para Vilia Rica Capital da Capitania de Minas ajustados em formarem o partido para a rebelião, e com effeito o dito Réu Tiradentes foi logo de caminho examinando os animos das pessoas a quem falava como foi aos Réus José Aires Gomes, e ao Padre Manoel Rodrigues da Costa; e chegando a Villa Rica a primeira pessoa a quem os sobreditos dois Tiradentes e Maciel falaram foi ao Réu Francisco de Paula Freire de Andrade que então era Tenente Coronel comandante da tropa paga da Capitania de Minas cunhado do dito Maciel; e supposto que o dito Réu Francisco de Paula hesitasse no princípio conformar-se com as idéias daqueles dois perfidos Réus, o que confessa o dito Tiradentes a folhas 10 verso do dito appenso n. 1; contudo persuadido pelo mesmo Tiradentes com falsa asserção, de que nesta Cidade do Rio de Janeiro havia um grande partido de homens de negocio promptos para ajudarem a sublevação, tanto que ella se effectuasse na Capitania de Minas; e pelo Réu Maciel seu cunhado com a phantastica promessa, de que logo que se executasse a sua infame resolução teriam socorro de Potências estrangeiras, referindo em confirmação disto algumas práticas que dizia ter por lá ouvido, perdeu o dito Réu Francisco de Paula, todo o receio como consta a folhas 10 verso e folhas 11 do appenso n. 1 e a folhas 7 do appenso n. 4 da devassa desta cidade, adotando os perfidos projectos dos ditos Réus para formarem a infame conjuração, de estabelecerem na Capitania de Minas uma república independente.


Mostra-se que na mesma Conjuração entrara o Réu Ignácio José de Alvarenga Coronel do primeiro regimento auxiliar da Companhia do Rio Verde ou fosse convidado e induzido pelo Réu Tiradentes, ou pelo Réu Francisco de Paula, como o mesmo Alvarenga confessa a folhas 10 do appenso n. 4 da devassa desta Cidade e que também entrara na mesma Conjuração do Réu Domingos de Abreu Vieira, Tenente Coronel de Cavallaria Auxiliar de Minas Novas convidado, e induzido pelo Réu Francisco de Paula como declara o Réu Alvarenga a folhas 9 do dito appenso n. 4 ou pelo dito Réu Paula juntamente com o Réu Tiradentes, e Padre José da Silva de Oliveira Rolim como confessa o mesmo Réu Domingos de Abreu a folhas 10 verso da devassa desta Cidade; e achando-se estes Réus conformes no detestável projecto de estabelecerem uma república naquella Capitania corno consta a folhas 11 do appenso n. 1 passaram a conferir sobre o modo da execução, ajuntando-se em casa do Réu Francisco de Paula a tratar da sublevação nas infames sessões que tiveram, como consta uniformemente de todas as confissões dos Réus chefes da conjuração nos, appensos das perguntas que lhe foram feitas; em cujos ventículos não só consta que se achasse o Réu Domingos de Abreu, ainda que se lhe communicava tudo quanto nelles se ajustava corno consta a folhas 10 do appenso n. 6 da devassa da Cidade, e se algumas vezes se conferisse em casa do mesmo Réu Abreu sobre a mesma matéria entre elles e os Réus Tiradentes, Francisco de Paula, e o Padre José da Silva de Oliveira Rolim; sem embargo de ser o lugar destinado para os ditos conventículos a casa do dito Réu Paula, para os quaes eram chamados estes Cabeças da Conjuração, quando algum tardava como se vê, a folhas 11 verso do appenso 1 da devassa desta Cidade, e do escripto folhas 41 da devassa de Minas do Padre Carlos Corrêa de Toledo para o Réu Alvarenga dizendo-lhe que fosse logo que estavam juntos.


Mostra-se que sendo pelo princípio do anno de mil setecentos e oitenta e nove se ajuntaram os Réus chefes da Conjuração em casa do Réu Francisco de Paula lugar destinado para os torpes, execrandos conventiculos, e ahi depois de assentarem uniformemente em que se fizesse a sublevação e motim na occasião em que se lançasse a derrama, pela qual suppunham que estaria o povo desgostoso, o que se prova por todas as confissões dos Réus nas perguntas constantes dos appensos; passaram cada um a proferir o seu voto sobre o modo de estabelecerem a sua ideada república, e resolveram que lançada a derrama se gritaria uma noite pelas ruas da dita Villa Rica - Viva a liberdade - a cujas vozes sem duvida acudiria o povo, que se achava consternado, e o Réu Francisco de Paula formaria a tropa fingindo querer rebater o motim, manejando-a com arte de dissimulação, enquanto da Cachoeira aonde assistia o Governador Geral, não chegava a sua cabeça, que devia ser-lhe cortada, o segundo voto de outros bastaria que o mesmo General fosse preso, e conduzido fora dos limites da Capitania dizendo-lhe que fosse embora, e que dissesse em Portugal que já nas Minas se não necessitava de Governadores; parecendo por esta forma que o modo de executar esta atrocissima acção ficava ao arbitrio do infame executor prova-se o referido do appenso n. l folhas 12 appenso n. 5 folhas 7 verso appenso 4 folhas 9 verso e folhas 10 pelas testemunhas folhas 103 e folhas 107 da devassa desta cidade e folhas 84 da devassa de Minas.


Mostra-se que no caso de ser cortada a cabeça do General, seria conduzido à presença do povo, e da tropa, e se lançaria um bando em nome da república, para que todos seguissem o partido do novo Governo consta do appenso n. 1 a folhas 12 e que seriam mortos todos aquelles que se lhe oppuzessem que se perdoaria aos devedores da Fazenda Real tudo quanto lhe devessem consta a folhas 89 verso da devassa de Minas e folhas 118 verso da devassa desta Cidade; em que aprehenderia todo o dinheiro pertencente à mesma Real Fazenda dos cofres reaes para pagamento da tropa consta do appenso n. 6 a folhas 6 verso e testemunhas folhas 104 e folhas 109 da devassa desta Cidade e a folhas 99 verso da devassa de Minas; assentando mais os ditos infames Réus na forma da bandeira e armas que deveria ter a nova república consta a folhas 3 verso appenso n. 12 a folhas 12 verso appenso n. 1 folhas 7 appenso n. 6 da devassa desta Cidade; em que se mudaria a Capitania para São João dâ??El-Rei, e que em Villa Rica se fundaria uma Universidade; que o ouro e diamantes seriam livres, que se formariam Leis para o governo da republica, e que o dia destinado para dar princípio a esta execranda rebellião, se avisaria aos Conjurados com este disfarce - tal dia é o baptisado - o que tudo se prova das confissões dos Réus nos appensos das perguntas; e ultimamente se ajustou nos ditos conventiculos o socorro, e ajuda com que cada um havia de concorrer.


Mostra-se, quanto ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes, que esta monstruosa perfídia depois de recitar naquellas escandalosas, e horrorosas assembléias as utilidades, que resultaria do seu enfame, se encarregou de ir cortar a cabeça do General consta a folhas 103 verso, e folhas 107, e dos appensos n. 4 a folhas 10 e n. 5 a folhas 7 verso da devassa desta cidade a folhas 99 verso da devassa de Minas, e conduzindo-a a faria patente ao povo e tropa, que estaria formada na maneira sobredita, não obstante dizer o mesmo Réu a folhas 11 verso do appenso n. 1 que só se obrigou a ir prender o mesmo General e conduzi-lo com a sua família fora dos limites da Capitania dizendo-lhe que se fosse embora parecendo-lhe talvez que com esta confissão ficaria sendo menor o seu delicto.


Mostra-se mais que este abominável Réu ideo a forma da bandeira que ia ter a república que devia constar de três triangulos com allusão as três pessoas da Santissima Trindade o que confessa a folhas 12 verso do appenso n. 1 ainda que contra este voto prevaleceu o do Réu Alvarenga que se lembrou de outra mais allusiva a liberdade que foi geralmente approvada pelos conjurados; também se obrigou o dito Réu Tiradentes a convidar para sublevação a todas as pessoas que pudesse confessa a folhas 12 appenso n. 1 satisfez ao que prometeu falando em particular a muitos cuja fidelidade pretendeu corromper principiando por expor-lhes as riquezes daquella Capitania que podia ser um Império florente, como foi a Antonio da Fonseca Pestana, a Joaquim José da Rocha, e nesta Cidade a João José Nunes Carneiro, e a Manoel Luiz Pereira, furriel do regimento de artilharia a folhas 16 e folhas 18 da devassa desta Cidade os quaes como atalharam a prática por onde o réu costumava ordinariamente principiar para sondar, os animos, não passou avante comunicar-lhe com mais clareza os seus malvados o perversos intentos confessa o Réu a folhas 18 verso appenso n. 1.


Mostra-se mais que o Réu se animou com sua costumada ousadia a convidar expressamente para o levante do Réu Vicente Vieira da Motta confessa este a folhas 73 verso e no appenso n. 20 chegando a tal excesso o descaramento deste Réu que publicamente formava discursos sediciosos aonde quer que se achava ainda mesmo pelas tavernas com mais escandaloso atrevimento, como se prova pelas testemunhas folhas 71 folhas 73 appenso n. 8 e folhas 3 da devassa desta Cidade e a folhas 58 da devassa de Minas; sendo talvez por esta descomedida ousadia com que mostrava ter totalmente perdido o temor das justiças, e o respeito e fidelidade de vida á dita senhora, reputado por um heroe entre os conjurados consta a folhas 102 e appenso n. 4 a folhas 10 da devassa desta Cidade.


Mostra-se mais que com o mesmo perfido animo, e escandalosa ousadia partiu o Réu de Villa Rica para esta Cidade em março de mil setecentos e oitenta e nove, com intento de publica e particularmente com as suas costumadas praticas convidar gente para o seu partido, dizendo a Joaquim Silvério dos Reis, que reputava ser do numero dos conjurados encontrando-o no caminho perante várias pessoas - Cá vou trabalhar para todos - o que juram as testemunhas folhas 15 folhas 99 verso folhas 142 verso folhas 100 e folhas 143 da devassa desta Cidade; e com effeito continuou a desempenhar a perfida commissão, de que se tinha encarregado nos abominaveis conventiculos falando no caminho a João Dias da Morta, para entrar na rebellião e descaradamente na estalagem da Varginha perante os Réus João da Costa Rodrigues e Antonio de Oliveira Lopes, dizendo a respeito do levante que - não era levantar que era restaurar a terra - expressão infame de que já tinha usado em casa de João Rodrigues de Macedo sendo reprehendido de falar em levante, consta a folhas 61 da devassa desta Cidade e a folhas 36 da devassa de Minas.


Mostra-se que nesta cidade falou o Réu com o mesmo atrevimento e escandalo, em casa de Valentim Lopes da Cunha perante várias pessoas, por occasião de se queixar o soldado Manoel Corrêa Vasques, de não poder conseguir a baixa que pretendia ao que respondeu o Réu como louco furioso que era muito bem feito que sofresse a praça, e que o assentasse, porque os cariocas americanos (sic) eram fracos vis de espíritos baixos porque podiam passar sem o julgo que soffriam, e viver independentes do Reino, e o toleravam, mas que se houvesse alguns como elle Réu talvez, que fosse outra cousa, e que elle receava que houvesse levante nas Capitanias de Minas, em razão da derrama que se esperava, e que em semelhantes circunstâncias seria facil de cujas expressões sendo repreendido, pelos que estavam presentes, não declarou mais os seus perversos e horríveis intentos consta a folhas 17 folhas 18 da devassa desta Cidade; e sendo o Vice-Rei do Estado já a este tempo informado dos aborninaveis projectos do Réu, mandou vigiar-lhe os passos, e averiguar as casas aonde entrava, de que tendo elle alguma noticia ou aviso, dispoz a sua fugida pelo sertão para as Capitanias de Minas sem dúvida para ainda executar os seus malévolos intentos se pudesse occultando-se para este fim em casa do Réu Domingos Fernandes, aonde foi preso achando-se-lhe as cartas dos Réus Manoel José de Miranda, e Manoel Joaquim de Sá Pinto do Rego Forte, para o Mestre de Campo Ignácio de Andrade o auxiliar na fugida [...]


Portanto condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Sebolas aonde o Réu teve as suas infames práticas e os mais nos sitios (sic) de maiores povoações até que o tempo também os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infamia deste abominavel Réu;


Igualmente condemnam os Réus Francisco de Paula Freire de Andrade Tenente Coronel que foi da Tropa paga da Capitania de Minas, José Alves Maciel, Ignácio José de Alvarenga, Domingos de Abreu Vieira, Francisco Antonio de Oliveira Lopez, Luiz Vás de Toledo Piza, a que com baraço e pregão sejam conduzidos pelas ruas públicas ao lugar da forca e nella morram morte natural para sempre, e depois de mortos lhe serão cortadas as suas cabeças e pregadas em postes altos até que o tempo as consuma as dos Réus Francisco de Paula Freire de Andrade, José Alves Maciel e Domingos de Abreu Vieira nos lugares de fronte das suas habitações que tinham em Villa Rica e a do Réu Ignácio José de Alvarenga, no lugar mais publico na Villa de São João de El-Rei, a do Réu Luiz Vaz de Toledo Piza na Villa de São José, e do Réu Francisco Antonio de Oliveira Lopes defronte do lugar de sua habitação na porta do Morro; declaram estes Réus infames e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens por confiscados para o Fisco e Câmara Real, e que suas casas em que vivia o Réu Francisco de Paula em Villa Rica aonde se ajuntavam os Réus chefes da conjuração para terem os seus infames conventiculos serão também arrasadas e salgadas sendo próprias do Réu para que nunca mais no chão se edifique. Igualmente condemnam os Réus Salvador Carvalho de Amaral Gurel, José de Resende Costa Pae, José de Resende Costa Filho, Domingos Vidal Barbosa, que com baraço e pregão sejam conduzidos pelas ruas públicas, lugar da forca e nella morram morte natural para sempre, declaram estes Réus infames e seus filhos e netos tendo-os e os seus bens confiscados para o Fisco e Câmara Real, e para que estas execuções possam fazer-se mais comodamente, mandam que no campo de São Domingos se levante uma forca mais alta do ordinario. Ao Réu Claudio Manoel da Costa que se matou no carcere, declaram infame a sua memoria e infames seus filhos e netos tendo-os e os seus bens por confiscados para o Fisco e Câmara Real. Aos Réus Thomás Antonio Gonzaga, Vicente Vieira da Morta, José Aires Gomes, João da Costa Rodrigues, Antonio de Oliveira Lopes condemnam em degredo por toda a vida para os presidios de Angola, o Réu Gonzaga para as Pedras, o Réu Vicente Vieira para Angocha, o Réu José Aires para Embaqua, o Réu João da Costa Rodrigues para o Novo Redondo; o Réu Antonio de Oliveira Lopes para Caconda, e se voltarem ao Brasil se executará nelles a pena de morte natural na forca, e applicam a metade dos bens de todos estes Réus para o Fisco e Camara Real. Ao Réu João Dias da Morta condemnam em dez anos de degredo para Benguela, e se voltar a este Estado do Brasil e nelle for achado morrerá morte natural na forca e applicam a terça parte dos seus bens para o Fisco e Camara real. Ao Réu Victoriano Gonçalves Veloso condemnam em açoutes pelas ruas publicas, tres voltas ao redor da forca, e degredo por toda a vida para a cidade de Angola, achado morrerá morte natural na forca para sempre, e applicam a metade de seus bens para o Fisco e Camara Real. Ao Réu Francisco José de Mello que faleceu no carcere declaram sem culpa, e que se conserve a sua memória, segundo o estado que tinha.


Aos Réus Manoel da Costa Capanema e Faustino Soares de Araújo absolvem julgando pelo tempo que tem tido de prisão purgados de qualquer presumpção que contra elles podia resultar nas devassas.


Igualmente absolvem aos Réus João Francisco das Chagas e Alexandre escravo do Padre José da Silva de Oliveira Rolim, a Manoel José de Miranda e Domingos Fernandes por se não provar contra elles o que basta para se lhe impor pena, e ao réu Manoel Joaquim de Sá Pinto do Rego Fortes fallecido no carcere declaram sem culpa e que conserve a sua memória segundo o estado que tinha; aos Réus Fernando José Ribeiro, José Martins Borges condemnam ao primeiro em degredo por toda a vida para Benguela e em duzentos mil para as despesas da Relação, e ao Réu José Martins Borges em açoutes pelas ruas publicas e dez annos de galés e paguem os Réus as custas. Rio de Janeiro,18 de Abril de 1792.


Vas.los

Gomes Ribrº

Cruz e Silva

Veiga

Figdº

Guerreiro

Montrº

Gayoso


Nota: Os juizes que condenaram Tiradentes e assinaram a sentença apenas com o sobrenome foram: Sebastião Xavier de Vasconcellos Coutinho (Chanceler da Rainha), Antônio Gomes Ribeiro, Antônio Diniz da Cruz e Silva, José Antônio da Veiga, João de Figueiredo, João Manoel Guerreiro de Amorim Pereira, Antônio Rodrigues Gayoso e Tristão José Monteiro.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Decisão Judicial - Inscrição na OAB sem Exame da Ordem

Não que eu seja contrário ao Exame da Ordem. Penso que deve existir sim um critério objetivo para avaliar se determinada pessoa possui conhecimentos mínimos em sua área de graduação, o que não significa que ela esteja preparada para advogar, até porque o árduo mister do advogado exige bem mais do que o conhecimento teórico que se aplica ao exame. A teoria é o pontapé inicial, mas não é tudo. Pode até se pensar em modificar o tipo de exame, suas etapas, mas abolir é medida radical e temerosa. Não obstante, vale reproduzir o teor de recente decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que assegurou a bacharéis em Direito, em sede de liminar em mandado de segurança, a inscrição nos quadros da OAB sem a necessidade de prestar o Exame da Ordem. Embora não compartilhe da mesma opinião, devo reconhecer que são interessantes os argumentos apontados pela Exmª Juíza.


DECISÃO

SILVIO GOMES NOGUEIRA, MARCELLO SANTOS DA VERDADE, ALESSANDRA GOMES DA COSTA NOGUEIRA, MARLENE CUNTO MUREB, FABIO PINTO DA FONSECA e RICARDO PINTO DA FONSECA impetram o presente Mandado de Segurança contra ato do Ilmo. Sr. Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Estado do Rio de Janeiro, postulando seja deferida liminar para que o impetrado se abstenha de exigir submissão dos impetrantes a exame de ordem para suas inscrições nos quadros da autarquia, determinando que sejam imediatamente aceitas mediante o cumprimento das demais exigências do art. 8º da L. 8.906/94, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 para o caso de descumprimento. Requer ao final a confirmação da liminar reconhecendo-se incidentalmente que a exigência do exame foi revogada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (L. 9.394/6, art. 43, inc. II e 48) e que o Estatuto da Ordem dos Advogados nesta parte é inconstitucional por ferir os arts. 5o, inc. XIII e 205 da Carta Magna. Inicial de fls.02/33.

Informações de fls.49/61 postulando pela denegação da segurança.

Decido.

Dispõe a Constituição Federal:

Art. 5º -
...
XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

A respeito do papel da OAB e do exercício da profissão de advogado dispõe a L. 8.906/94:

Art. 1º São atividades privativas de advocacia:
I - a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;
II - as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.
§ 1º Não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de habeas corpus em qualquer instância ou tribunal.
§ 2º Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados.
§ 3º É vedada a divulgação de advocacia em conjunto com outra atividade

Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:
I - capacidade civil;
II - diploma ou certidão de graduação em direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada;
III - título de eleitor e quitação do serviço militar, se brasileiro;
IV - aprovação em Exame de Ordem;
V - não exercer atividade incompatível com a advocacia;
VI - idoneidade moral;
VII - prestar compromisso perante o conselho.

Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:
I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;
II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.

Ora, a Carta Magna limita o direito ao exercício da profissão à qualificação profissional fixada em lei. Qualificação é ensino, é formação. Neste aspecto, o exame de ordem não propicia qualificação nenhuma e como se vê das recentes notícias e decisões judiciais reconhecendo nulidade de questões dos exames (algumas por demais absurdas), tampouco serve como instrumento de medição da qualidade do ensino obtido pelo futuro profissional. Desta forma, a L. 8.906/94 no seu art. 8º, inc. IV é inconstitucional. A OAB por outro lado, não se constitui em instituição de ensino como disciplinada pela L. 9.394/96. Isto posto, DEFIRO A LIMINAR para determinar à autoridade coatora que se abstenha de exigir dos impetrantes submissão a exame de ordem para conceder-lhes inscrição, bastando para tanto o cumprimento das demais exigências do art. 8º da L. 8.906/94. Oficie-se e intime- se. Após, ao Ministério Público Federal voltando conclusos para sentença.

Prolatado por MARIA AMELIA ALMEIDA MENOS DE CARVALHO

domingo, 19 de abril de 2009

Thomas More




“De fato, Eminência, penso que não é certo nem justo que o ter-se apoderado do dinheiro alheio acarrete ao ladrão a perda da vida. Isto porque penso também que riqueza alguma pode justificar a perda de uma vida humana. Mas, se me objetarem que este castigo pretende punir a transgressão da lei e da justiça, e não apenas a extorsão de dinheiro, por que não chamar a essa justiça extrema e rigorosa a suma injustiça ? Pois não deve ser consentida legislação tão cruel e dura que por uma pequena e ocasional infração desembainhe imediatamente a espada justiceira, nem devem ser promulgadas leis tão estóicas que considerem ao mesmo nível todos os crimes e não estabeleçam diferença entre tirar a vida a um homem e tirar-lhe a bolsa. Ora, se respeitamos a justiça, não poderemos, de modo algum, ver qualquer similitude ou grau de igualdade entre estas duas ações.” (em A Utopia. São Paulo: Martin Claret, 2000, p. 32-33)

sábado, 18 de abril de 2009

Diário de um Detento

Trata-se de um rap do grupo Racionais MC'S, cuja letra discorre acerca do Massacre do Carandiru, ocorrido em 02 de outubro de 1992, quando, em represália a uma rebelião, a Polícia dizimou 111 (cento e onze) presidiários daquela instituição carcerária. Há quem diga que a Polícia recebeu o aval para atuar do então Governador de São Paulo, Luiz Antônio Fleury Filho (a propósito, o nome do mesmo é mencionado, por duas vezes, no rap). A citada música, cuja letra pode ser conferida adiante, faz parte do álbum "Sobrevivendo no Inferno".





"São Paulo, dia 1º de outubro de 1992, 8h da manhã.


Aqui estou, mais um dia.


Sob o olhar sanguinário do vigia.


Você não sabe como é caminhar com a cabeça na mira de uma HK.


Metralhadora alemã ou de Israel.


Estraçalha ladrão que nem papel.


Na muralha, em pé, mais um cidadão José.


Servindo o Estado, um PM bom.


Passa fome, metido a Charles Bronson.


Ele sabe o que eu desejo.


Sabe o que eu penso.


O dia tá chuvoso. O clima tá tenso.


Vários tentaram fugir, eu também quero.


Mas de um a cem, a minha chance é zero.


Será que Deus ouviu minha oração?


Será que o juiz aceitou a apelação?


Mando um recado lá pro meu irmão:


Se tiver usando droga, tá ruim na minha mão.


Ele ainda tá com aquela mina.


Pode crer, moleque é gente fina.


Tirei um dia a menos ou um dia a mais, sei lá...


Tanto faz, os dias são iguais.


Acendo um cigarro, vejo o dia passar.


Mato o tempo pra ele não me matar.


Homem é homem, mulher é mulher.


Estuprador é diferente, né?


Toma soco toda hora, ajoelha e beija os pés,


e sangra até morrer na rua 10.


Cada detento uma mãe, uma crença.


Cada crime uma sentença.


Cada sentença um motivo, uma história de lágrima,


sangue, vidas e glórias, abandono, miséria, ódio,


sofrimento, desprezo, desilusão, ação do tempo.


Misture bem essa química.


Pronto: eis um novo detento.


Lamentos no corredor, na cela, no pátio.


Ao redor do campo, em todos os cantos.


Mas eu conheço o sistema, meu irmão, hã...


Aqui não tem santo.


Rátátátá... preciso evitar


que um safado faça minha mãe chorar.


Minha palavra de honra me protege


pra viver no país das calças bege.


Tic, tac, ainda é 9h40.


O relógio da cadeia anda em câmera lenta.


Ratatatá, mais um metrô vai passar.


Com gente de bem, apressada, católica.


Lendo jornal, satisfeita, hipócrita.


Com raiva por dentro, a caminho do Centro.


Olhando pra cá, curiosos, é lógico.


Não, não é não, não é o zoológico.


Minha vida não tem tanto valor


quanto seu celular, seu computador.


Hoje, tá difícil, não saiu o sol.


Hoje não tem visita, não tem futebol.


Alguns companheiros têm a mente mais fraca.


Não suportam o tédio, arruma quiaca.


Graças a Deus e à Virgem Maria.


Faltam só um ano, três meses e uns dias.


Tem uma cela lá em cima fechada.


Desde terça-feira ninguém abre pra nada.


Só o cheiro de morte e Pinho Sol.


Um preso se enforcou com o lençol.


Qual que foi? Quem sabe? Não conta.


Ia tirar mais uns seis de ponta a ponta (...)


Nada deixa um homem mais doente


que o abandono dos parentes.


Aí moleque, me diz: então, cê qué o quê?


A vaga tá lá esperando você.


Pega todos seus artigos importados.


Seu currículo no crime e limpa o rabo.


A vida bandida é sem futuro.


Sua cara fica branca desse lado do muro.


Já ouviu falar de Lucífer?


Que veio do Inferno com moral.


Um dia... no Carandiru, não... ele é só mais um.


Comendo rango azedo com pneumonia...


Aqui tem mano de Osasco, do Jardim D'Abril, Parelheiros,


Mogi, Jardim Brasil, Bela Vista, Jardim Angela,


Heliópolis, Itapevi, Paraisópolis.


Ladrão sangue bom tem moral na quebrada.


Mas pro Estado é só um número, mais nada.


Nove pavilhões, sete mil homens.


Que custam trezentos reais por mês, cada.


Na última visita, o neguinho veio aí.


Trouxe umas frutas, Marlboro, Free...


Ligou que um pilantra lá da área voltou.


Com Kadett vermelho, placa de Salvador.


Pagando de gatão, ele xinga, ele abusa


com uma nove milímetros embaixo da blusa.


Brown: "Aí neguinho, vem cá, e os manos onde é que tá?


Lembra desse cururu que tentou me matar?"


Blue: "Aquele puta ganso, pilantra corno manso.


Ficava muito doido e deixava a mina só.


A mina era virgem e ainda era menor.


Agora faz chupeta em troca de pó!"


Brown: "Esses papos me incomoda.Se eu tô na rua é foda...


"Blue: "É, o mundo roda, ele pode vir pra cá."


Brown: "Não, já, já, meu processo tá aí.


Eu quero mudar, eu quero sair.


Se eu trombo esse fulano, não tem pá, não tem pum.


E eu vou ter que assinar um cento e vinte e um."


Amanheceu com sol, dois de outubro.


Tudo funcionando, limpeza, jumbo.


De madrugada eu senti um calafrio.


Não era do vento, não era do frio.


Acertos de conta tem quase todo dia.


Ia ter outra logo mais, eu sabia.


Lealdade é o que todo preso tenta.


Conseguir a paz, de forma violenta.


Se um salafrário sacanear alguém,


leva ponto na cara igual Frankestein.


Fumaça na janela, tem fogo na cela.


Fudeu, foi além, se pã!, tem refém.


Na maioria, se deixou envolver


por uns cinco ou seis que não têm nada a perder.


Dois ladrões considerados passaram a discutir.


Mas não imaginavam o que estaria por vir.


Traficantes, homicidas, estelionatários.


Uma maioria de moleque primário.


Era a brecha que o sistema queria.


Avise o IML, chegou o grande dia.


Depende do sim ou não de um só homem.


Que prefere ser neutro pelo telefone.


Ratatatá, caviar e champanhe.


Fleury foi almoçar, que se foda a minha mãe!


Cachorros assassinos, gás lacrimogêneo...


quem mata mais ladrão ganha medalha de prêmio!


O ser humano é descartável no Brasil.


Como modess usado ou bombril.


Cadeia? Claro que o sistema não quis.


Esconde o que a novela não diz.


Ratatatá! sangue jorra como água.


Do ouvido, da boca e nariz.


O Senhor é meu pastor... perdoe o que seu filho fez.


Morreu de bruços no salmo 23,


sem padre, sem repórter.


sem arma, sem socorro.


Vai pegar HIV na boca do cachorro.


Cadáveres no poço, no pátio interno.


Adolf Hitler sorri no inferno!


O Robocop do governo é frio, não sente pena.


Só ódio e ri como a hiena.


Ratatatá, Fleury e sua gangue


vão nadar numa piscina de sangue.


Mas quem vai acreditar no meu depoimento?


Dia 3 de outubro, diário de um detento."





Letra retirada do site: http://diariodeumdetento.racionaismcs.letrasdemusicas.com.br/

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Robert Louis Stevenson




"E aconteceu que o sentido dos meus estudos científicos, que me conduziam à mística e às coisas transcendentes, suscitou e derramou imensa claridade nesse caráter de guerra permanente entre o bem e o mal em que me debatia. Em cada dia, as duas partes da minha inteligência, a moral e a intelectual, atraíam-me mais e mais para essa verdade, cuja descoberta parcial fora em mim condenada a tão pavoroso naufrágio: que o homem não é realmente uno, mas duplo. Digo duplo porque o estado do meu conhecimento não vai além desse ponto. Outros poderão prosseguir, outros exceder-me-ão nestes limites; mas atrevo-me a pensar que o homem será um dia caracterizado pela sua constituição multiforme, incongruente, com suas facetas independentes umas das outras. De minha parte, segui infalivelmente numa só direção. Na minha própria pessoa habituei-me a reconhecer a verdadeira e primitiva dualidade humana, sob o aspecto moral. Depreendi isto das duas naturezas que formam o conteúdo da consciência, e se eu pudesse corretamente dizer que era qualquer das duas, seria ainda uma prova de que eu era ambas. Desde muito tempo, ainda antes que as minhas descobertas científicas começassem a sugerir-me a simples possibilidade de semelhante milagre, aprendi a admitir e a saborear, como uma fantasia deliciosa, o pensamento da separação daqueles dois elementos. Se cada um, dizia eu comigo, pudesse habitar numa entidade diferente, a vida libertar-se-ia de tudo o que é intolerável. O mau poderia seguir o seu destino, livre das aspirações e remorsos do seu irmão gêmeo, a sua contraparte boa; e esta caminharia resolutamente, cheia de segurança, no caminho da virtude, fazendo o bem em que tanto se compraz, sem se expor à desonra e à penitência engendradas pelo perverso. Constitui uma maldição do gênero humano que esses dois elementos estejam tão estreitamente ligados; que no âmago torturado da consciência continuem a digladiar-se. De que modo poderiam ser dissociados ?" (em O Médico e o Montro. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 72)

terça-feira, 14 de abril de 2009

Chuta que é Macumba!!!


"Hum hum... Mizifi, mizifi!!!"


O Ministério Público do Estado do Acre publicou no Diário Oficial desta segunda-feira, dia 13, a recomendação Nº 001/09, da lavra da Promotora de Justiça Drª Gilcely Evangelista. O documento é dirigido "às instituições religiosas e à sociedade do Rio Branco", para que se abstenham de praticar atos discriminatórios por motivos de religião e nem exerçam coação capaz de limitar a liberdade do indivíduo de ter a religião de sua preferência. Dentre as considerações tecidas pela nobre representante do Parquet, tem-se o uso de expressões pejorativas em relação às religiões afrobrasileiras, como "encosto", "feitiçaria", "bruxaria", "sessão de descarrego", "macumbaria", entre outras. Mal foi publicada, a recomendação já é alvo de piadas e críticas, não obstante sua boa intenção. Os que a repudiam, alegam afronta à liberdade de expressão. Neste ponto, sabe-se que é princípio básico de Hermenêutica Constitucional que nenhum Direito Fundamental - nem a vida - é absoluto. Então, o fato de uma pessoa ter o direito de exercer livremente sua religião (ou mesmo não exercer qualquer religião) não dá à mesma carta branca para ofender os demais, por não professarem a mesma fé. Ademais, o objetivo das religiões não é o de prejudicar as pessoas, mas dar sentido à vida das mesmas, dar-lhes algo em que acreditar.




Para que o leitor tire suas próprias conclusões, eis o link contendo a recomendação do Ministério Público, na íntegra (arquivo em formato PDF, necessário ter o programa Adobe Acrobat Reader instalado):








domingo, 12 de abril de 2009

Ingo Wolfgang Sarlet



"Além disso, como já frisado, não se deverá olvidar que a dignidade - ao menos de acordo com o que parece ser a opinião largamente majoritária - independe das circunstâncias concretas, já que inerente a toda e qualquer pessoa humana, visto que, em princípio, todos - mesmo o maior dos criminosos - são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas - ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmos." (em Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 46, sem destaque no original)

sábado, 11 de abril de 2009

Não sou Sílvio Santos, mas o cliente ficou com a casa

No fim do ano passado, fui procurado por um cliente que, desesperado, dizia estar prestes a perder sua casa. Ao analisar as peças do processo, verifiquei que o único bem que possuía, que é o imóvel onde o mesmo mora com seus filhos, fora penhorado para satisfazer uma execução de título extrajudicial ajuizada pela Caixa na Justiça Federal de Alagoas (mas a Caixa não é um Banco Social ?). Pior: O prazo para a oposição de embargos à execução havia, há muito, transcorrido.

Resolvi checar a jurisprudência dos Tribunais Regionais Federais. Os acórdãos eram unânimes no sentido de que, por se tratar de matéria de ordem pública, a arguição de impenhorabilidade de bem de família poderia ser feita a qualquer tempo, mesmo esgotado o prazo para oferecimento de embargos e desde que o bem já não tenha sido arrematado, em simples petição atravessada nos autos.




CIVIL E PROCESSO CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. LEI 8.009/90. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. ALEGAÇÃO NO BOJO DA PRÓPRIA EXECUÇÃO. PERDA DO PRAZO PARA A OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DO DEVEDOR. IRRELEVÂNCIA. 1. A alegação da impenhorabilidade do bem de família pode ser instrumentalizada no bojo da execução fiscal, não sendo imprescindível aduzi-la em embargos do devedor. Demais disso, revelando a questão contornos de ordem pública, de sorte a evidenciar o interesse público na sua averiguação, não há falar em preclusão pela inobservância do prazo correspondente aos embargos, sendo certo que poderá ser ventilada mediante petição atravessada nos próprios autos da execução, ou, inclusive, na via estreita dos embargos à arrematação. 2. Demonstrado que o bem penhorado engasta-se no conceito legal de bem de família, absolutamente impenhorável por força do art. 1º da Lei 8.009/90, merece ser mantida a decisão hostilizada, que desconstituiu a constrição que sobre ele recaía. 3. Agravo de instrumento improvido. (Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Agravo de Instrumento. Processo Nº 200404010432984 RS. Órgão Julgador: Primeira Turma. Data da Decisão: 15/06/2005. Relator: Wellington Mendes de Almeida)



É lógico que a impenhorabilidade não tem caráter absoluto, comportando exceções (art. 3º da lei Nº 8.009/90). Dentre elas:



...

II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;

...

V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar.

...



No caso cujo patrocínio me foi confiado, o empréstimo tinha sido feito pela empresa do cliente, que, na época da celebração do contrato com o Banco, "já não andava bem das pernas", para a formação de capital de giro. Entretanto, a empresa não se recuperou e o empréstimo foi aumentando, até chegar em um valor impraticável. Se ele já não tinha o suficiente para pagar o valor do empréstimo, que dirá este valor acrescido de juros extorsivos ? E eu achando que usura... Bem, o fato é que cabia a alegação de impenhorabilidade, já que o empréstimo foi feito pela pessoa jurídica e para a pessoa jurídica. E sabemos que só se desconsidera a pessoa jurídica quando houver comprovação de que o sócio a estiver utilizando para cometer fraudes ou com abuso de poder (art. 50 do Código Civil)!!!



Protocolei um pedido de Desconstituição de Penhora, fundamentando a peça com base nas razões acima expostas. Como foi juntada uma certidão do cartório de registro de imóveis da cidade, atestando que o imóvel penhorado era o único bem em nome do cliente, nem a Caixa se opôs à desconstituição (contra fatos não há argumentos, certo ?), razão pela qual o pleito foi deferido. Mais um cliente satisfeito.




O que é que você acha disso, meu caro Señor Abravanel ?






Rarraêêêê, ririiiiiiii.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Cesare Beccaria



"Cada homem tem sua maneira de ver; e o mesmo homem, em épocas distintas, vê diversamente os mesmos objetos. O espírito de uma lei seria, pois, o resultado da boa ou da má lógica de um juiz, de uma digestão fácil ou penosa, da debilidade do acusado, da violência das paixões do magistrado, de suas relações com o ofendido, enfim, da reunião de todas as pequenas causas que modificam as aparências e transmutam a natureza dos objetos no espírito mutável do homem." (em Dos Delitos e Das Penas. Martin Claret: São Paulo, 2004, p. 22-23)

domingo, 5 de abril de 2009

Tente Outra Vez!!!

Em outubro do ano passado, ingressei com um Mandado de Segurança na Justiça Federal, representando uma empresa de Móveis e eletrodomésticos, contra o INMEQ (Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade). Isto porque a autarquia impetrada aplicou na empresa uma multa, por causa da ausência de etiquetas de energia em alguns fogões.


Impetrei o writ, alegando, com base em farta jurisprudência, como a colacionada adiante, que a responsabilidade pela falta de etiquetação dos produtos é do fabricante, não podendo ser, neste caso, imputada ao comerciante.


ADMINISTRATIVO. INMETRO. FISCALIZAÇÃO. ETIQUETA. AUSÊNCIA MULTA. FABRICANTE. RESPONSABILIDADE. Compete ao fabricante a responsabilidade pela ausência de etiqueta indicativa dos cuidados para conservação do produto, sob pena de imposição de multa pelo INMETRO. (TRF 4ª Região. Apelação Cível. Processo Nº 200671000080282 RS. Órgão Julgador: Terceira Turma. Data da Decisão: 29/07/2008. Relator: Roger Raupp Rios)


Neste ponto, o leitor pode estar se questionando: Mas não há solidariedade entre fabricante e comerciante ? Se fosse uma relação consumerista, haveria, por força do diploma legal específico. Solidariedade não se presume; decorre da LEI. O caso trazido à discussão é de Direito Administrativo.


Inclusive existe uma Portaria do CONMETRO que assevera que a responsabilidade pela falta das etiquetas é tanto do comerciante quanto do fabricante. Obviamente que este regulamento administrativo extrapolou sua função de explicar a lei. É um regulamento que queria ser lei, mas ficou só na vontade mesmo.


Voltando ao caso, impetrei o Mandado de Segurança em 31/10/2008, uma sexta-feira. Na segunda-feira, dia 03 de novembro, a liminar foi concedida, suspendendo os efeitos da multa. Devido à liminar, a empresa informou que havia retirado a multa, daí já era de se esperar que o juiz extinguisse o processo sem exame do mérito por perda superveniente do objeto da ação. Até aí tudo bem, não fosse o fato de o magistrado, na sentença proferida em 16 de dezembro de 2008, condenar a parte impetrante ao pagamento das custas processuais. Cuma ? É isso mesmo, a parte impetrante foi condenada a pagar as custas, mesmo tendo a parte impetrada reconhecido o erro e retirado a multa.


Conversando com a cliente, esta disse que não achava aquilo justo e perguntou o que se poderia fazer para evitar o pagamento das custas. Eu ofereci duas opções: Apelar da decisão, somente quanto a esta parte específica; ou fazer um pedido de reconsideração. Ela perguntou qual das duas opções eu achava melhor. Respondi a ela que, certamente, seria a segunda. Foi um risco e o leitor deve estar se perguntando "por que a reconsideração ao invés da apelação, já que é praticamente impossível um juiz reformar uma decisão que ele mesmo lavrou ?". Simples: Pelo custo e pelo tempo. Se eu apelasse da decisão, a parte impetrante teria que desembolsar mais algum dinheiro para o pagamento do preparo (trata-se de requisito de conhecimento do recurso. Sem dinheiro, o recurso sequer é lido), enquanto que a decisão de reconsideração é free. Além disso, é só comparar o valor das custas que seriam pagas pela parte vencida com o valor do preparo, que é bem maior, porque deve cobrir as despesas de translado do processo até o TRF da 5ª Região, que fica em Recife. E o fator tempo dispensa comentários, não ?


Pois bem, no último dia do expediente forense, lá estava eu na Justiça Federal, protocolando o tal pedido de reconsideração. Desta vez, defendi que, como a decisão fora pela extinção do processo sem julgamento do mérito, não havia parte vencedora nem parte vencida, portanto não havia sucumbência. Assim, o critério para saber quem pagaria as custas seria o da causalidade, ou seja, qual das partes deu causa à perda do objeto. Certamente que era a parte impetrada, pois, no momento do ajuizamento do MS, havia interesse, a multa ainda permanecia ativa. Se a autoridade coatora retirou a multa só após a determinação liminar, ela foi quem deu causa à perda do objeto, chegando a reconhecer, em suas informações, que a multa era realmente indevida. Juntei umas cinco páginas só de jurisprudência. Uma delas merece destaque, o qual farei a seguir:


PROCESSUAL CIVIL. PERDA DE OBJETO DA AÇÃO POR CAUSA SUPERVENIENTE. CUSTAS E HONORÁRIOS.- EM NÃO HAVENDO SUCUMBÊNCIA, A PARTE QUE DÁ CAUSA AO PROCESSO RESPONDE PELAS DESPESAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE).- SENTENÇA TERMINATIVA DO PROCESSO, POR MOTIVO SUPERVENIENTE, IMPONDO ÀS AUTORAS, APELANTES, CUSTAS E HONORÁRIOS COMO SE TIVESSE HAVIDO PEDIDO DE DESISTÊNCIA.- A CONDENAÇÃO DA PARTE QUE NÃO DERA CAUSA AO PROCESSO, TANTO QUE BENEFICIÁRIA DE LIMINAR NÃO CUMPRIDA PELA UNIÃO, REPRESENTARIA UMA INJUSTIÇA À PRIMEIRA E UM PRÊMIO INDEVIDO À SEGUNDA.- ISENÇÃO DE AMBAS AS PARTES, A PEDIDO DAS APELANTES, DEFERIDA. (Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Apelação Cível 200134. Processo 9905674330 PE. Órgão Julgador: Terceira Turma. Data da Decisão: 08/05/2003. Relator: Desembargador Federal Ridalvo Costa).


Assim, dei entrada nesta petição e fui aproveitar o natal e o ano novo (em termos, porque sempre tem alguém que, mesmo nesta época, precisa de um Habeas Corpus, e lá vai o Papai Noel...). Em janeiro, tudo voltou ao seu ritmo normal (mais ou menos, porque o ano só começa mesmo depois do carnaval), os trabalhos forenses recomeçaram e... já no final do mês, veio a decisão:


"... 8. Com essas considerações, defiro o pleito de reconsideração da impetrante de fls. 47-53, condenando a autoridade impetrada a ressarcir à impetrante as custas por ela adiantadas. 9. No mais, mantenho a sentença vergastada em todos os seus termos. 10. Oportunamente, arquivem-se os presentes autos, com baixa na distribuição..."